sábado, 28 de novembro de 2015

DICIONÁRIO ENCICLOPÉDICO DE MELGAÇO


Por Joaquim A. Rocha


Escritores Melgacenses




Jerónimo José Andrade. Filho do Dr. Francisco Daniel Nogueira, médico do exército, e de Mariana Josefa Veloso de Campos de Andrade. Nasceu em Melgaço em 1750. // No Dicionário Histórico, Biográfico, etc., na página 511 lê-se: «escritor que se conhece somente pela sua obra, intitulada “Descrição do estado em que ficaram os negócios da capitania de Moçambique nos fins de Novembro de 1789, com algumas observações e reflexões sobre as causas da decadência do comércio, e dos estabelecimentos portugueses na costa oriental da África”. Escrita no ano de 1790. Saiu no Investigador Portuguez, no ano de 1815, começando no n.º XLVI, e continuada nos seguintes até ao LIV, em que terminou.» // Na Wikipédia acrescentam-se mais alguns dados. Diz-se aí que tinha sido militar, e secretário do governo de Moçambique de 1783 a 1784; com a patente de brigadeiro, foi comandante das armas de Pará, Brasil, a 5/3/1803. Também fora nomeado governador da capitania de Santa Catarina, mas não assumiu o cargo. // Escreveu o general A. E. Mateus da Silva: {Em 1796, e então sargento maior do regimento de artilharia da marinha, JJNA foi autor do «Projecto de huma nova arma Portuguesa». Este manuscrito encontra-se na Biblioteca Nacional, carateriza-se por uma grande minuciosidade, e nele o seu autor descreve a construção de uma arma balística que designou “foguete incendiário”.}              

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   Dr. António Augusto Durães. Nasceu na Vila de Melgaço a 24 de Julho de 1891 e faleceu a 24 de Outubro de 1976. Foi advogado em Melgaço e noutros concelhos, governador civil de Benguela. Obras: «Angola e o General Norton de Matos – subsídios para a História e para uma biografia», edição de Maio de 1976. Durante anos escreveu vários artigos em jornais, e chegou mesmo a ser diretor do Jornal de Melgaço. Na sede do concelho existe uma rua com o seu nome.   

                            // (continua)...

quarta-feira, 25 de novembro de 2015

LEMBRANÇAS AMARGAS

romance

Por Joaquim A. Rocha



V

O saber é a fonte de todos os padecimentos


      Estou na idade das perguntas, a curiosidade não me larga, quero saber o porquê das coisas, porque aconteceram assim, poderiam ter sucedido de outro modo, enfim, o saber não ocupa lugar, diz o povo, e eu desejo ter esse conhecimento, o prazer mórbido do saber. A minha mãe pode ser uma verdadeira fonte de informações, e hoje encontra-se bem-disposta, palradora. Eis-me a perguntar:

- Mamã, por que é que os seus pais a deixaram ir para São Justo, para junto da sua madrinha? Na sua idade, oito anos, sempre seria melhor ter estado com eles, o carinho é muitas vezes mais importante do que a comida.
- Eu ressenti-me sempre dessa ausência, era como se não tivesse pais; ao teu avô era raríssimo ver, a tua avó ia-me visitar, mas poucas vezes, até parece que evitavam ver-me. Sofri muito com isso, em silêncio, e de que eu tinha muitas saudades era dos meus irmãos, quase nunca tinha o prazer de os ver. A minha madrinha gostava muito de mim, só era mais velha do que eu nove anos, o meu padrinho, irmão dela, foi estudar para Braga, só vinha a casa nas férias, com ele não tinha tanta confiança. Os pais dos meus padrinhos eram pessoas de muito respeito, ele passava o dia na Vila, no hospital da Misericórdia, e ela estava sempre em casa, a dar ordens às criadas e a verificar se tudo corria bem; tinham caseiros, colhiam pão e vinho, matavam todos os anos dois grandes porcos, tinham sempre a casa muito cheia, muito farta, mas ela não era mulher de se assoar, dizia sempre: «olhem para o pão como se olha para Deus», na altura não compreendia e quase não comia pão, eu que tanto gostava daquela broa com centeio, mas pensava que não se devia comer, pois também não se come o senhor Deus.
- Eles tratavam-na como criada?
- Sim e não. Eu tinha de trabalhar como as outras, não me mandaram à escola, diziam que não era preciso, pois filha de jornaleiro o que necessitava era de saber tratar da casa, casar e ter filhos, para isso é que tinha nascido. Estudos que os fizessem os da classe alta, esses tinham de governar o país e o povo, para que é que o Estado estaria a gastar dinheiro com os pobres, a abrir escolas em todas as aldeias portuguesas, como fizera o conde Ferreira, se depois iam trabalhar nos campos e nas fábricas, pescar por esses mares fora, servia de muito a escola. Assim eles pensavam e não me deram estudos. A minha madrinha sim, estudara, sabia piano, cantava maravilhosamente, fazia renda, que mãos! Depois arranjou um namorado endinheirado, trabalhava no Brasil, era filho de um fulano da nossa terra que tinha emigrado para lá há muitos anos, era muito rico, dizia-se, embora não fosse fidalgo como ela, mandara fazer ali na aldeia dele uma grande casa, parecia um palácio, andava sempre de cavalo, também tinha um carro, foi o primeiro automóvel que vi na vida, mas as estradas não prestavam, ele preferia o cavalo; bem vestido, fato branco, ele dizia «o meu terno», toda a gente tirava o chapéu quando ele passava. Tempos!
- Quando você foi para Lisboa, em 1926, a sua madrinha embarcou para o Brasil.
- Sim, casou e foi para lá; nunca mais a vi, nem sei se já morreu, oxalá que não, coitada, se tem filhos, parece que sim; o meu padrinho também se casou, era professor, foi viver para Braga ou Porto, não sei. Os pais deles morreram há pouco tempo, de velhos.
- Bem, você não me disse a razão por que saiu de casa, os seus pais não podiam sustentá-la?
- Não foi bem isso: onde comem quatro, comem cinco. O problema não estava na comida, mas sim naquilo que acontecera. Quando eu tinha seis anos de idade morreu o meu irmão, que não era filho do meu pai Gaspar, parece que era filho de um guarda da alfândega, por quem a minha mãe se apaixonara; nessa altura a minha mãe ainda era solteira e rapariga nova. Esse meu irmão, o Roberto, espetou um ferro em brasa nas partes, quando trabalhava na serralharia, e foi morrer ao Porto, no hospital de São João; os médicos tudo fizeram por ele, lancetaram-no e tudo, mas não conseguiram salvá-lo. Eu era muito pequenina, mas lembro-me que naquela casa nunca mais houve sossego, a tua avó ficou louquinha, coitada, não fazia mais nada se não chorar, andava sempre metida na igreja, a pedir a Deus pelo filho, mas ele já tinha partido, o meu pai começou a bater-lhe, ela não fazia o comer, não tratava das roupas, não tinha gosto pela vida, ia todos os dias ao cemitério chorar, chamar por ele, até chegaram a dizer que os largos portões do cemitério, feitos pelo meu avô materno, se abriram para ela entrar e carpir na campa, eu não estava lá, não vi, não sei quem viu, mas dizem que é verdade, que foi o espírito dele que os abriu, estas coisas acontecem. Não te estejas a rir que isto são coisas sérias, com isto não se brinca, até nos pode acontecer qualquer coisa – «para longe satanás».
- Fica-se com a impressão de que a avó gostava mais desse filho do que dos outros, nascidos do casamento do meu avô Gaspar! A você não ligou nenhuma, e tinha apenas seis anos. Além disso tinha a Marília com onze anos e o Vítor com oito, três crianças a necessitar do carinho da mãe, ela devia ter sido mais forte.
- Essas coisas não se explicam, ela gostou muito do antigo namorado «não há amor como o primeiro», lá diz o adágio, e era esse filho que lho recordava; depois de ele morrer nada existia, ficou como que perdida no mar agitado, ela já não queria saber de coisa nenhuma; era como se o mundo tivesse desabado, para ela acabou quando o meu querido irmão morreu; coitado, ele adorava-nos, era o mais velho, nascera em 1896, andava na música e tinha uma serralharia, vê lá com dezoito anos já era patrão, saía ao avô e ao tio, tinha um rapazinho com ele, um aprendiz, era muito bom, os colegas da banda gostavam muito dele, toda a gente dizia bem dele, era querido de todos, mas Deus quis chamá-lo para a sua beira e quando assim é não há nada a fazer, temos de lhe obedecer, ele é que manda, ele sabe o que faz.
- Se tivéssemos um excelente hospital, bons médicos e bons equipamentos, talvez não tivesse falecido então, hoje possivelmente ainda estaria vivo; mas não, o hospital é velho, do século passado, só tem dois médicos de clínica geral, nem um cirurgião, nem um especialista, a gente até pode morrer com uma dor de dentes, nem um dentista há, é o enfermeiro que trata disso, arranca os dentes como um qualquer veterinário, desgraçados daqueles que caem doentes.
- Não penses dessa maneira, meu filho, olha que Deus pode castigar-te. Ele é que sabe, o meu irmão foi chamado à sua divina presença, ele está bem, melhor do que nós, que sofremos, que penamos os pecados que todos os homens até agora cometeram, nós temos de expiar todos esses pecados, os que morrem novos são os escolhidos por Deus para irem para a sua beira, têm vida eterna, não padecem nada.
- Estou de acordo consigo, depois de exalarmos o último suspiro não se sofre mais, mas isso da vida eterna… pode terminar, tudo termina, e a eternidade também pode ter um fim; eu prefiro sofrer, mas vivo, apesar de não ter nada, coisa alguma, gosto de viver, mesmo aqui, na espelunca, mas aqui no planeta Terra. // (continua)...                        

segunda-feira, 23 de novembro de 2015

OS NOVOS LUSÍADAS

Por Joaquim A. Rocha



19

Os rios estão sujos, poluídos,
Os mares já não tem a azul cor;
Os belos bosques foram destruídos,
As florestas choram, de medo e dor.
Os animais fogem esbaforidos,
Os humanos não amam Zeus nem Thor.
Já ninguém aqui tem amor à vida,
Pois sentem que a pátria está perdida.

20

A besta fez do Estado a coutada,
Onde caça a pomba e a perdiz;
O incauto é sua presa amada,
E este povo, inerte, nada diz.
Tudo e todos são alvos da cilada,
Ninguém escapa às armas subtis.
E tu Camões, que esta terra cantaste,
O teu saber e arte em vão gastaste.

// (continua)...

sábado, 21 de novembro de 2015

LINA - FILHA DE PÃ

romance

Por Joaquim A. Rocha

desenho de Luís Filipe Gonzaga Pinto Rodrigues

2.º Capítulo

    
     O tempo foi passando. A Lina, endiabrada, já conhecia toda a gente dos arredores. Entrava nas casas das pessoas, com um à-vontade incrível. Fazia imensos recados, e em troca recebia umas côdeas de pão e às vezes uns ovos para que a sua mãe lhe fizesse umas gemadas, a fim de ela crescer e tornar-se mulher. Um dia, próximo do natal, estando reunida com um grupo de raparigas amigas, começaram a trocar prendas entre si. Uma delas, que pronunciava muito mal as palavras, por ser gaga, diz:

- Esta boneca é prà.., é prà…, Li… Li… Lina.

      As outras riram e gozaram:

- É Pràlina! É Pràlina!

    E a alcunha nasceu e pegou. Passado algum tempo toda a turma do lugar a tratava por Pràlina. As raparigas e rapazes da sua idade brincavam com ela: «Pràlina malina, menina ladina.» Afinava e atirava pedras aos rapazes, mas eles fugiam dela como o diabo da cruz. Aqueles olhos verdes, penetrantes, infiltravam-se na alma do mais afoito. Todos a temiam, até o sacerdote! Agora andava sempre com a cruz de Cristo ao peito, não fosse o diabo tecê-las. A Lina, sabendo que a temiam, exagerava. Costumava dizer às crianças da sua idade:

- Sabem, eu tenho poderes ocultos; quando olho muito tempo para uma janela, posso partir-lhe os vidros! Se olho fixamente para uma ave ela cai do ramo!

     Elas acreditavam, e por isso pediam-lhe com veemência:

- Lina: não faças essas coisas, depois as pessoas adultas batem-te.

     Ela ria-se com gosto, e respondia:

- Estejam descansadas: eu não quero fazer mal a ninguém; mas se me tratarem como a um cão raivoso, ou como a um sapo nojento, eu mostro-lhes do que sou capaz. – E continuou com as suas pantominices.

     Nesse dia a conversa ficou por ali, pois a sua mãe chamou-a e ela teve de ir para casa. O pai já tinha regressado de fora, mas vinha com uma doença grave, a maldita tuberculose. O médico aconselhou-o a ir fazer tratamento para o Caramulo, mas ele adiava sempre, na esperança de melhorar.               

- Ó Sileno, vai para o Caramulo, aqui acabas por morrer. E é pena, porque ainda és um homem novo.
- E o dinheiro para a viagem, Senhor Doutor?
- Pede à Santa Casa da Misericórdia, não é nenhuma fortuna. Eu também contribuo com qualquer coisa. Se for necessário faz-se uma subscrição pública.

     E graças à iniciativa do clínico, um certo dia o Sileno meteu-se na carreira no lugar do Couto, junto às Termas, até à Vila de Monção, e dali partiu no comboio para aquela estância de repouso.
     Os políticos locais bem tinham lutado pelo caminho-de-ferro, «uma obra de grande necessidade», segundo afirmavam, mas nunca conseguiram trazê-lo até à sua terra; a estação do comboio do concelho vizinho fora inaugurada em 1915, com foguetes e fanfarra. Estes ficaram à espera, sentados. «Não há verba», diziam os governantes. Mas para gastar fortunas na I Grande Guerra, sobretudo a partir de 1917, e para outras coisas menos importantes e supérfluas, apareceu!

**
     
     Na primeira segunda-feira de Setembro de 1926 a Lina foi para a escola. Ficava quase a um quilómetro da sua casa. O seu lugar de nascimento, chamado Pomarães, ficava num alto, já no início da montanha, e os invernos começavam mais cedo do que nas freguesias ribeirinhas, perto do rio Minho. Foi na companhia de outras raparigas e rapazes e, como era a descer, depressa chegaram à escola. Era no antigo convento e havia instalações para ambos os sexos. As salas eram assaz pequenas, as carteiras minúsculas, o que valia era que as crianças também eram pequeninas, algumas mesmo raquíticas, e assim lá iam cabendo dentro daquele espaço exíguo.

     A professora Olívia chamou as alunas pelo seu nome próprio e algumas delas não respondiam, porque, embora presentes, sempre tinham sido tratadas por alcunhas, e desconheciam o seu verdadeiro nome.

- Lina Cancela!

    A cachopa levantou-se e disse:

- Sou eu, senhora professora. Mas todos me chamam Pràlina.

     A mestra pensou um bocado e observou:

- Aqui na sala de aulas és Lina; lá fora que te tratem como quiserem. E o mesmo serve para as tuas companheiras.
   
     As primeiras aulas foram interessantes. O livro da primeira classe trazia algumas imagens engraçadas e as moças divertiam-se à grande com elas. Passado algum tempo, as garotas já estavam fartas do livro, da loisa, do quadro negro, do giz – irritante para caraças – e até da professora, sempre aos gritos, sempre zangada, sempre pronta a malhar com a cana-da-índia ou com a régua. Todos os dias aquilo. Era uma autêntica prisão, um sacrifício quase inútil, segundo a mentalidade da época.

- E para quê? – perguntava constantemente o avô materno. – Para quê? Eu não fui à escola e estou aqui: casei, tive filhos, agora tenho netos. Aprendi quase tudo sobre lavoura, trabalhei, e trabalho, como um moiro, e tinha que vergar a espinha na mesma se tivesse tirado a instrução primária. Exemplos não faltam aqui no lugar: o Tibúrcio tem a quarta classe, e para que lhe serve? Mal sabe ler e escrever, esqueceu tudo aquilo que aprendera nas aulas. Até tem dificuldade em assinar o nome dele. Pede-se-lhe para escrever uma carta e diz logo que não tem tempo! Os filhos do Zé Cortiça, esses sim: foram os dois para padre e agora estão bem. Até dizem que um deles, o mais novo, o senhor cónego, vai chegar a bispo!
- Da maneira que falas, até parece que tens inveja deles! Não me digas que querias ser sacerdote?! – desabafa a Clotilde, despeitada.       
- Lá estás tu com os teus ciúmes, mulher! Reconheço que eles vivem bem, são ilustres, considerados e respeitados por toda a gente, mas eu não gostava de ser cura. Não tinha paciência para estudar aqueles anos todos no Seminário. E ir para a cidade, para longe dos meus pais, dos meus irmãos, da minha terra e dos meus amigos, não! Não trocava isto por nada deste mundo. Nasci para viver aqui: com a lavoura, com a vinha, com o gado, com a minha família. Não! Padre, nunca!
- Havia de dar um rico clérigo! – diz, a rir, uma das filhas do casal.
- Era como os outros! Não conhecem aquele ditado: «façam o que eu digo, não façam o que eu faço.»     

     Todos os presentes se riram com vontade, apesar da piadinha já ser velha e relha! Conheciam muito bem o que se dizia de alguns párocos do concelho, andavam com fulana e sicrana, mas os crentes perdoavam-lhes, porque sabiam que eram homens, e os homens pecam.


- Quem não tiver pecados que atire a primeira pedra – desafiou Clotilde, lembrando-se da sua juventude. // (continua)...

quarta-feira, 18 de novembro de 2015

DICIONÁRIO ENCICLOPÉDICO DE MELGAÇO


Por Joaquim A. Rocha




Cartas de um castrejo

11.ª - «Senhor Redactor: as neves sucessivas, entremeadas por vezes de um sol abrasador, que nos desafiava à rajeira, as nossas idas e vindas à branda – ora sob uma temperatura tropical, ora sob um frio das estepes da Rússia, produziram um violento ataque de gripe, que nem nos deixou ir aí dia nove, nem mesmo nos permite, ainda, dar o passeio habitual, para colher informações. E como Deus não tira um bem que não dê outro, eis que uma carta do meu bom amigo Rodrigues, encarregado do Registo Civil nesta freguesia, carta repassada de sentimento e amargura, me dá azo a escrever a minha, entremeando-a de passagens interessantes que me descreve, deixando transparecer a maior indignação por inúmeros desmandos que por aqui se dão, e fazendo comparações dignas, a meu ver, de registo. Começando: «Esteve aqui no dia três de Abril do corrente o Senhor Vilarinho, inspector escolar, segundo informações fidedignas em sindicância ao professor desta freguesia, por este haver num ímpeto de dignidade e pundonor, tentar pôr um dique aos desmandos do célebre cabo Carvalho, comandante do posto de despacho e transgressor emérito das leis que o nosso respeitável regímen assinou e decretou.» Continua o amigo Rodrigues citando factos ilegais que mais ou menos já havemos noticiado e chega à conclusão de que, a caminhar isto assim «é melhor ser guarda-fiscal em Castro Laboreiro do que Presidente da República em Lisboa.» Ataca fortemente os descuidos lamentáveis da falta de instrução para o nosso povo, da carência de meios de comunicação, de aumento progressivo das contribuições – que só deveríamos pagar como tributo de guerra, abunda em considerações justas e em queixas razoáveis e de ponderar, terminando com este grito, que indubitavelmente lhe sai do fundo da alma: «Santo Deus! Que bárbaros que abandonam a lei do Eterno, pondo entraves a quem trabalha licitamente!» // [Estiveram] entre nós, nos primeiros dias da semana passada, os senhores inspector primário deste círculo escolar e o chefe da Guarda-Fiscal neste concelho, para averiguarem de factos respeitantes aos seus subordinados aqui (…). Pedimos licença para apontar a Suas Ex.ªs o caminho a seguir: Inspector, criação de escolas e melhoramentos radicais na existente; Chefe, instruções ríspidas aos seus guardas para que não exorbitem das suas funções, nem se arrede, um ápice, do cumprimento dos deveres inerentes ao seu cargo. // Um facto engraçado que nos chegou (…) ao conhecimento, é o da escolha como galegos de quatro touros, de seis de um rebanho, apreendidos nas Veigas (entre esta vila e o Vido). Parece uma mentira! Que caras as daqueles quatro “muchachos” para, os competentes, os tomarem como de nacionalidade espanhola? (…) // No lugar das Eiras (Pedroso) faleceu  Maria Ganhanas; era ainda relativamente nova, razão por que a sua morte foi muito sentida. Que esteja em Deus, para único lenitivo dos doridos a quem cumprimentamos e ao amigo Rodrigues, em espírito, enquanto esta gripe de má raça nos não deixa ir fazê-lo pessoalmente. Mande-nos, que o Redactor do Correio de Melgaço continuará a ser benevolente connosco, dando publicidade às nossas queixas, quando justas. // Castro Laboreiro, 13/4/1916.»    

segunda-feira, 16 de novembro de 2015

ENTRE MORTOS E FERIDOS

(Dois anos de guerra na Guiné-Bissau)

desenho de Luís Filipe Gonzaga Pinto Rodrigues

5.º Capítulo

ACADEMIA MILITAR


     O número de carros começava a aumentar na cidade, a poluição crescia proporcionalmente, Lisboa alterava, impavidamente, a sua fisionomia. Alguns estabelecimentos comerciais encerravam mais cedo por causa dos assaltos, a noite começava a ser perigosa. Os dois amigos encontram-se de novo e encetam longa conversa:

- O trabalho na Academia Militar não matava ninguém, chegava a aborrecer-me de fazer tão pouco, e o comer não era mau de todo.
- Seria sinal de que já se estava a habituar ao rancho?
- Talvez não; a comida era de facto melhor, embora não fosse boa. Os cozinheiros não eram militares.
- Sendo assim!...
- Na Academia trabalhava, como empregado civil, o marido da minha irmã, de seu nome Rudolfo. Era rijo como um touro bravo. Nunca vira ninguém com tanta força. Levantava um saco de cem quilos de batata com a mesma facilidade com que eu levanto dez quilos! Viera da província de Trás-os-Montes para Lisboa, com as mãos cheias de calos, provocados pela enxada, cumprir o serviço militar, e por cá foi ficando depois daquele concluído. Quando podia chamava-me e perguntava se eu queria moquir alguma coisa, visto que amiúde os seus chefes lhe pediam para ajudar na cozinha. Raríssimas vezes aceitei – nunca fui comilão.
- Podia ter aproveitado.
- Pois podia! Dizia-me ele, constantemente: «Dou aos outros, que não me são nada, por que não hei-de dar ao meu cunhado?!» Mas eu, não sei por quê, não queria, não aceitava.
- Orgulho?
- Quem sabe… talvez. Há coisas que não têm explicação, essa é uma delas. Eu julgo que era mais vergonha, embora uma coisa e outra pudessem existir em mim. Sabes: é a personalidade de cada um de nós. Somos todos diferentes, apesar de termos muitíssimas características em comum. Por outro lado, herdamos traços dos nossos antepassados – pais, avós…
- Por falar nisso, nunca me falou do seu pai!
- É verdade, nunca te falei dele… mas crê-me, nada há para dizer a esse respeito. Partiu, teria eu três meses de vida. Emigrou para as Américas, segundo me contou a minha mãe. Deve ter arranjado por lá outra mulher, rodeou-se de fedelhos, ou então morreu, mas não de saudades certamente.  
- Lamento.
- Nem sequer o conheci. A minha mãe também pouco me falava dele. Ficou apenas uma fotografia, um pedaço de papel. O tempo tudo faz esquecer. Não se pode ter saudades daquilo que não se viveu, do que não se amou.

         Henrique compreendeu. Em Cândido existia uma mágoa profunda, algo de inexplicável, uma ferida nunca fechada, talvez um segredo. Não insistiria.

- Desviou-se do assunto! – lembrou Henrique.
- Pois desviei. Falava da Academia Militar. Sabes que a condução em Lisboa jamais se tornou fácil para mim. Não me sentia com competência bastante para guiar naquelas ruas movimentadas e com aqueles polícias sinaleiros sempre a fazer sinais, pareciam autênticos robôs! Questão de medo, de carácter, sei eu lá! Os jipes, tudo bem, mas as outras viaturas…
- Para se conduzir bem é necessário concentração. A sua mente andava agitada. E agora já não tinha o instrutor ao lado.
- Pois não. Era eu o máximo responsável pela condução. Certo dia, na subida da Rua Joaquim António de Aguiar, a caminho de Sintra, com vários cadetes dentro, um a meu lado e os restantes nos bancos de trás, o motor deixou de funcionar. Acelera, não acelera, estava a ver que não conseguia sair dali! Os carros, na minha retaguarda, começavam a buzinar ininterruptamente, pessoas ansiosas, olhando para os relógios de pulso, enervando-me ainda mais, se possível. «Com os diabos!» - resmunguei entre dentes. «Sou um zero à esquerda a conduzir, não sei como me vou livrar desta
     O meu Cireneu, quem me socorreu naquela aflição, foi um dos cadetes. Pede-me, com esmerada educação e ao mesmo tempo com autoridade: «Você está muito nervoso, passe para o meu lado, eu guio
     Obedeci prontamente – queria sair dali, ultrapassar aquela ridícula situação.
- Sentia-se humilhado! – comentou, com semblante triste, Henrique.
- Eu sentia-me mais frustrado. Não gostava que traçassem o meu destino. A tropa não era nenhuma etapa da minha vida – estava ali contrariado. Eu até poderia um dia aprender a conduzir, comprar um carro, mas assim não – eu não nascera para escravo, para obedecer...
- E para mandar?! – atira Henrique, como um repto.
- Nem para isso, meu amigo. A minha filosofia de vida resume-se a pouco: todos somos iguais, homens e mulheres, e devemos viver em liberdade e responsabilidade; cada um de nós dá à sociedade o melhor de si e recebe aquilo de que necessita. Para sermos felizes não precisamos de muito. Todos devíamos ter direito à instrução, ao conhecimento, e depois cada um escolhe, mediante as suas potencialidades, a sua profissão.
- Há profissões melhores do que outras…
- Aparentemente é assim. Um mineiro pode queixar-se de levar uma vida dura, pouco saudável; mas se ele gostar dessa actividade, só quer uma coisa – boas condições de trabalho, além de óptima remuneração, que lhe permita viver bem, sem sobressaltos. Os pescadores, por exemplo, arriscam a vida no mar, mas vai dizer-lhes para abandonarem essa faina! Não querem, gostam daquilo que fazem, sentem-se livres como as aves do céu e também úteis à sociedade. Contudo, quanto a mim, devem ser bem pagos e dar-lhes a oportunidade de se instruírem. Um barco pode estar bem equipado, ter uma pequena biblioteca, música, etc. E por aí fora. Todos os mesteres são dignos desde que as pessoas que os desempenham o sejam.
- Até certo ponto estou de acordo, mas isso é utópico.
- A utopia só o é enquanto não se torna realidade. Não era utópico desejar a República? Pois em 5 de Outubro de 1910 uns quantos republicanos conseguiram-no! Não penses que foi fácil, muitos obstáculos surgiram, mas por fim a vitória surgiu radiosa.
- Não durou muito! – contrapõe Henrique.
- É verdade, não durou muito, apenas dezasseis anos. A igreja católica, apoiada pelos monárquicos, e também alguns pseudo republicanos, tudo fizeram para a derrubar. Paiva Couceiro, refugiado em Espanha, invadiu o país pelo norte, mas saiu-lhe o tiro pela culatra. No entanto, a minha história não é essa.
- Fiquei com curiosidade: no regresso levou a viatura para a Academia?
- Sim, com alguma facilidade. Acalmei, os cadetes fizeram por esquecer o triste episódio, e tudo correu bem. Nunca ouviste dizer que «para baixo todos os santos ajudam?!»
- Ainda bem, senão seria traumático para si.
- Ainda procurei mudar de especialidade. Argumentei que era baixo, mal chegava aos pedais, enfim, que não queria continuar a conduzir.
- E eles?
- Esperei pela resposta. Nunca me foi dada!

     Com altos e baixos, asneiras e proezas, alguns reveses, os dias morriam um a um; dias que ia abatendo no meu canhenho. O tempo, no seu rolar lento e imperturbável, começava a ganhar volume. Dez, onze meses – contava desde Janeiro – é muita hora para um soldado que anda na tropa por obrigação, como se estivesse no presídio. Comecei a criar ilusões e a fazer perguntas, interrogações, a mim próprio: «Ter-se-iam esquecido de mim, porventura?! já não irei para a guerra colonial?!»
- Porém…
- Pura ilusão! Sonho infantil! Finalmente chegara o momento da terrível notícia, aquela que nos destroça, nos fulmina. É como subir ao cadafalso, ao patíbulo, para nos separarem a cabeça do resto do corpo! O amanuense avisou-me de que o 1.º sargento me esperava na Secretaria. Era um homem aparentemente simpático, mas cruel. Nem sequer rodeou a questão. Não queria perder tempo: «Arruma a trouxa, foste mobilizado para a província da Guiné-Bissau; tiveste pouca sorte, seria muito melhor Angola, ou mesmo Moçambique. Paciência, alguém teria de ir para lá
- Teve azar… - lamentou sinceramente Henrique.
- Já não faltava muito para completar um ano de serviço militar. Tive, de facto, pouca sorte. Não me podia esquecer de que representava um simples número, e os números jogam-se, não se esquecem!                    
- Como reagiu?
- Perdi completamente o apetite; esperneei de raiva. A Guiné-Bissau apavorava qualquer um: o clima, a guerra, as doenças, feriam, matavam, dizimavam, diziam os que de lá vinham! Um camarada de caserna, fervoroso católico, aconselhou-me a fazer uma promessa a Nossa Senhora de Fátima e aos dois pastorinhos que morreram logo a seguir a 1917, primos da Lúcia. «Vais ver que te protegem», garantiu-me.
     Eu, desiludido com tudo, descrente, digo-lhe: «Não adianta, morre quem tem de morrer!» Ele não ficou nada convencido com a minha precipitada resposta: «Não é bem assim – olha que conheço muitos que se salvaram oferecendo promessas aos santos da sua devoção.» E mencionou uma caterva de santinhos, com os seus milagres.
     Eu, que não estava interessado na conversa, rematei: «Sopraram, para as suas bandas, ventos benfazejos; do meu lado apanhei com os tufões
- Ele estava a tentar somente ajudá-lo, não devia ter sido tão severo – reprova Henrique.
- Hoje estou arrependido, mas na ocasião, danado como estava, não reflecti o suficiente e fui antipático com o camarada. Há momentos na nossa vida em que a ajuda, ou pseudo ajuda, dos outros nos parece ofensiva. Eu fui mobilizado e logo para a pior frente de guerra.
- Se você não fosse iria outro…
- Isso é verdade, eles teriam que preencher as vagas; mas logo eu, que não gostava minimamente da tropa, muito menos da guerra. Quem a provocou que a combatesse; que fosse o Salazar e os seus ministros, os secretários de Estado, e podiam levar com eles as suas amantes…, a famelga completa.      
- Não adianta protestar, manda quem pode; sempre foi assim e assim continuará a ser.
- Talvez não: a inteligência e a cultura do cidadão comum levá-lo-á a rejeitar a violência, é uma questão de tempo. O cérebro evolui.  

- Optimista! – ironiza Henrique, convencido de que as coisas não mudam do pé para a mão. – As mudanças levam anos, ou séculos, a concretizarem-se – remata ele.  // Continua...

sábado, 14 de novembro de 2015

AS MINHAS ANEDOTAS

Por Joaquim A. Rocha 



    Jesus Cristo andava a viajar pelo planeta, acompanhado do seu inseparável Pedro, quando, numa rua manhosa de uma qualquer vila ou cidade, dá de caras com um mendigo, homem novo, estendido no chão, aparentemente inválido. Olha para o desgraçado e diz-lhe: «Levanta-te e anda.» O pedinte não gostou nada daquilo que ouviu. Vira-se para Jesus e diz-lhe com azedume: «ouça lá, quer estragar-me o negócio? Eu levanto-me quando quero, ando quando me apetece, e você não tem nada que me dar ordens, ouviu? Não é meu dono, nem meu patrão. E não se atreva a pedir esmola nesta rua, senão...» Emanuel ficou esmagado, não esperava aquela reação. Confessa ao seu companheiro de viagem: «Pedro, cada dia que passa gosto menos dos humanos; são ingratos, desonestos, malcriados.» Pedro, até ali calado, observa: «Senhor, o melhor é irdes para o vosso planeta, a que chamais céu, aqui na terra estais deslocado; esta gente não presta, é agressiva, ainda vos mata.» Jesus meditou um pouco e diz ao seu amigo terrestre: «tens razão; o problema é o transporte».     

*

O marido, embriagado, diz à mulher:

- Acabou-se o Paraíso!

     A esposa, que sabia do que ele estava a falar, comenta:

- Ainda bem que acabou. Bebesses menos; és uma esponja!

- Não posso passar sem ele.

- Não quero saber. Vai para o inferno.

     Afinal de contas “Paraíso” era a marca de vinho que ele costumava comprar. 


















quarta-feira, 11 de novembro de 2015

DICIONÁRIO ENCICLOPÉDICO DE MELGAÇO

Por Joaquim A. Rocha





MACRÓBIOS

*

 Fiães

     Fiães é uma das freguesias do concelho de Melgaço, distrito de Viana do Castelo; está situada a centenas de metros de altitude, quase na serra, e faz fronteira com a Galiza. Ali, o rio Trancoso, nascido em Castro Laboreiro, divide os dois países: Portugal e Espanha. Dessa freguesia avista-se a vila, sede do concelho, e até algumas terras galegas. A paisagem é maravilhosa, espetacular, sobretudo nos dias de primavera e verão. O antigo mosteiro dos monges já desapareceu, restando apenas a igreja, já com alguns séculos de existência. Há alguma literatura sobre esta bela freguesia, a qual vou divulgando na rubrica «Escritores Melgacenses». Acerca dos macróbios, ou gente de muita idade, que ali viveu, ou ainda vive, quero sublinhar o facto de que nestas terras aparentemente agrestes os seres humanos são capazes de chegar aos cem anos de vida com alguma facilidade, devido a uma alimentação saudável, a um clima suportável, a um ar não poluído. Conheci pessoas desses espaços rurais que morreram velhinhas sem nunca terem consumido medicamentos! Ao contrário, na cidade anda-se sempre à volta dos médicos e dos remédios. Eis mais duas senhoras que faleceram já velhinhas:  

FERREIRA, Deolinda. Filha de António Ferreira e de Maria Joaquina Domingues. Nasceu na freguesia de Fiães em finais de 1913 ou inícios de 1914. // Casou com Artur Alves. // Faleceu a 22 de Junho de 2014, com cem anos e alguns meses de idade, no estado de viúva, e foi sepultada no cemitério da sua freguesia de nascimento.  


MARQUES, Ana Joaquina. Filha de Manuel José Marques e de Maria Rosa Domingues, lavradores, residentes no lugar de Adavelha. Neta paterna de João Marques e de Maria Ventura; neta materna de Manuel Domingues “Carvalheira” e de Ana Luísa Martins. Nasceu em Fiães a 20 de Junho de 1872 e foi batizada na igreja católica local a 24 desse mesmo mês e ano. Padrinhos: António Domingues, casado, lavrador, e Ana Domingues, lavradeira, do lugar de Soutomendo de Baixo. // Casou com António Joaquim Alves, na igreja de Fiães, a 30 de Setembro de 1900. // Ambos os cônjuges faleceram na freguesia de Fiães: o marido a 29 de Agosto de 1954 e ela, esposa, a 15 de Janeiro de 1979, com 106 anos de idade.

domingo, 8 de novembro de 2015

GENTES DE MELGAÇO

Freguesia da Vila 

Por Joaquim A. Rocha



PAÇO, Adriano. Filho de Lourenço do Paço, ferrador, da Vila de Monção, e de Albina Cândida Moreira, padeira, da Vila de Melgaço, moradores na Rua Nova de Melo. Neto paterno de João Manuel do Paço e de Maria Francisca Pires, da Vila de Monção; neto materno de Mariana Vasques, solteira, padeira, da Vila de Melgaço. Nasceu na Rua Nova de Melo, Vila de Melgaço, a 16/2/1894 e foi batizado a 17 de Março desse mesmo ano. Padrinho: António Pires Teixeira, solteiro, “brasileiro”, por ter sido emigrante no Brasil, natural da Vila de Melgaço. // Andou na escola primária dos sete aos doze anos; fez exame do 1.º grau na escola Conde de Ferreira, Vila, a 15/7/1907, obtendo um «bom». // Depois da escola, aprendeu a arte de sapateiro com o mestre Zorobabel Martins Rodrigues, mais conhecido por “Abel Sapateiro”, cuja oficina estava instalada na Praça do Comércio, atual Praça da República, mantendo-se ali até ir para a tropa – seria alistado no quartel de Valença a 18/7/1914, tendo sido combatente na I Grande Guerra (1914-1918). Em Janeiro de 1918 já se encontrava em França há oito meses; era o soldado n.º 566. Mandou nessa altura uma carta para o Jornal de Melgaço a pedir uma madrinha de guerra (ver Jornal de Melgaço n.º 1192, de 26/1/1918). // A 5/11/1920 ingressou, como soldado, na Guarda-Fiscal, no batalhão n.º 3, Porto, com o n.º 2307/20. Andou por Matosinhos, Póvoa de Varzim, Peneda, Tibo, Várzea, Paradela, e São Gregório, Cristóval, acabando por se reformar a 1/4/1945, com vinte e cinco anos de serviço. // Casou na igreja de Santa Eulália, Monção, a 28/11/1925, com Arminda da Glória, de 26 anos de idade, filha de Florinda Pereira Caldas, da freguesia de São João de Sá, concelho de Monção. // Faleceu na sua casa de São Gregório, freguesia de Cristóval, concelho de Melgaço, a 17/10/1959 (ou 15 ou 17/11/1959). // A sua viúva faleceu também em São Gregório em Fevereiro de 1973, com 71 anos de idade. // Pai de Armanda, de Honório, de Maria Ermelinda, de Maria da Glória, e de Henrique. // Contam-se dele inúmeras histórias, algumas pouco asseadas, outras que fazem rir o mais sisudo. Uma delas pode ler-se no meu «Dicionário Enciclopédico de Melgaço», volume II, página 22 – Anedotário Melgacense.      

quinta-feira, 5 de novembro de 2015

SONETOS

Por Joaquim A. Rocha 



DESILUSÃO



Fui à lusa capital manhã fria,
Em busca dum certo e caro amigo;
Encontrei tanta gente sem-abrigo,
Vivendo em pura melancolia.

Custou-me a acreditar no que via:
Lisboa era a sede do mendigo,
Padecendo quiçá duro castigo
De crime que eu cometera um dia.

Voltei de lá triste, tão desolado,
Jurando nunca mais ali voltar;
Àquela cidade do velho fado...

De belas mouras por desencantar.
Pisando um trilho amaldiçoado,
D’onde o sol foge e não há luar.